As batidas altas eram
excruciantes. Aquele ambiente era impróprio para qualquer ser
humano, em sua opinião. Mas se queria mesmo aquilo, aquele era o
lugar. Deixou aquela batida insuportável balançar seus quadris
suavemente de lado para lado e fechou os olhos. Exalava sensualidade
e sabia. Todos na pista de dança daquela espelunca sabiam. Seus
movimentos atraíam olhares de todos os tipos, mas do bar, um par de
olhos verdes fixou-se nos quadris dançantes para não se desprender
mais. Nem mesmo para bebericar de seu dry martini. Os movimentos
feitos pelos quadris eram hipnotizantes e depois de alguns minutos, o
par de olhos já havia se rendido.
Levantou-se, abandonando o
dry mantini, erguendo a alta figura magra e esbelta. Era dona de
lábios fartos e desenhados e um sorriso escoado de quem esconde
segredos curvos, assim como sua silhueta. Aproximou-se de Adele e de
seus quadris dançantes, levando as mãos de dedos finos e longos ao
ombros da outra, virando-a para si. Os olhares fixaram-se e um
sorriso idêntico brotou em ambos os lábios. Completaram-se. Adele,
sutilmente retirou as mãos da estranha de seus ombros e as juntou as
suas, num gesto carinhoso nada condizente a sua personalidade voraz.
Com um verniz impecável
perante a sociedade no geral, Adele se passava como qualquer mulher
para todos. Inclusive para a bela estranha naquele estranho lugar.
Virou de costas, pousando as mãos da estranha em seus quadris, ainda
dançantes, e provocantemente uniu os corpos de ambas. Tirou os
cabelos loiros e longos do pescoço, o oferecendo à moça que nem o
nome sabia, como se fosse frágil, como se oferece também o controle
da situação. Pobre engano.
Enquanto dançavam noite
adentro, do lado de fora daquela pequena pocilga o mundo ainda girava
e a polícia ainda corria contra o tempo. E Adele pouco se importava.
Ainda era anônima e invencível. E seria até quando quisesse.
'Caroline.'
'O que?', sussurrou Adele
entre os lábios entrelaçados.
'Meu nome é Caroline.',
disse a estranha. Sua voz era rouca e grossa, quase fez Adele rir.
Assentiu e segurou Caroline pelas mãos, a guiando para a saída. A
noite estava gelada, mas nenhum vento ousava passar pelas ruas
esburacadas daquela parte da cidade. Caroline usava uma calça social
e uma ribana, seu terninho estava em mãos. Seu conjunto era todo
preto, assim como seu salto de bico fino.
'Sou Adele. Traje bonito,
Caroline.', disse com um sorriso debochado. Caroline riu sem graça e
pôs o curto cabelo atrás da orelha.
'Sou advogada, saí do
trabalho para uns drinks e deparei com você.', ela era perfeita. Era
advogada!
'Advogada? Que incrível!',
Adele fingiu surpresa mesclada com algo gostoso e cruzou os braços,
tremendo levemente de frio. Sabia brincar de ser frágil como
ninguém. Caroline sorriu como o doce de mulher que era e a envolveu
com seu terninho. 'Só falta me dizer que é da vara criminal.',
torcendo em seu âmago para que fosse, Adele observou a próxima
expressão de Caroline concordar. Um leão dentro dela rugiu.
Caroline era simplesmente perfeita. Perfeita! Era inteligente, porém
não demais. Era astuta, esperta, mas sua vida havia caído na
mesmice. Ela queria algo mais, queria o brilho em seus olhos de novo.
E mataria por isso. Adele sabia. Caroline não fora a sua primeira
cúmplice. E não seria a última.
Nenhum comentário:
Postar um comentário